Nutricionistas: o estigma no contexto da obesidade.

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O sobrepeso e a obesidade são condições multifatoriais, que podem estar associadas a uma variedade de determinantes genéticos, hormonais ou ambientais. Fatores socioculturais (como ambiente alimentar), biológicos (como genética) e psicológicos (como depressão e estresse), influenciam a ingestão de energia e de alimentos, o gasto energético e, consequentemente, o peso dos indivíduos.

Nos últimos anos, o processo de estigmatização do sobrepeso e da obesidade aumentou rapidamente e uma das razões é a suposição de que o excesso de peso poderia ser controlado pela própria pessoa, portanto, aqueles que apresentam excesso de peso seriam os próprios responsáveis por este, negligenciando-se os determinantes biológicos, genéticos e ambientais envolvidos.

Além de consequências fisiológicas negativas para o bem-estar e saúde, a estigmatização do peso transcende em nível social. A literatura tem sugerido um modelo cíclico onde o estigma do peso pode ser visto como um evento estressor para os indivíduos, o que leva ao aumento dos níveis de cortisol com consequente aumento no consumo de alimentos, resultando em ganho de peso, o que por sua vez, promove ainda mais estigma. A estigmatização do peso também foi considerada um preditor de alimentação não saudável e inatividade física.

Apesar do estigma do peso ser muito comum na população em geral, uma das maiores fontes de estigma relacionado ao peso pode ser observada em profissionais da área da saúde, e estas atitudes podem reprimir a busca por apoio para a prevenção da saúde devido ao receio de serem estigmatizados em relação ao peso. Dentre os profissionais de saúde, os nutricionistas desempenham um papel importante no controle do excesso de peso. Diante deste cenário, um estudo de revisão sistemática teve como objetivo conhecer as percepções dos nutricionistas sobre as causas da obesidade e a magnitude da estigmatização de pacientes com obesidade por esta categoria profissional

A revisão sistemática foi realizada utilizando as bases de dados: PubMed, PsycINFO, Web of Science e Cochrane Library. Foram incluídos oito estudos – destes, cinco envolveram indivíduos norteamericanos, dois vieram da Grã-Bretanha e um foi baseado em amostra alemã. O nível de qualificação dos participantes variou entre os estudos. Quatro deles incluíram nutricionistas com experiência clínica, três estudos incluíram estudantes de nutrição e um estudo incluiu estudantes e nutricionistas. A maioria destes (n=7) utilizou diferentes questionários para avaliar a atitude dos nutricionistas em relação à obesidade e também a Escala de Fobia de Gordura (EFG). As pontuações da EFG podem variar entre 1 e 5. Uma pontuação de 3,6 pode ser vista como moderadamente fóbica de gordura e superior a 4,4 indica altos níveis de fobia de gordura. Uma pontuação média para a população em geral varia entre 3,16 a 3,65.

Seis estudos encontraram um preconceito significativo relacionado ao peso por nutricionistas (estudantes ou profissionais). Quatro estudos relataram um grau médio na EFG variando entre 3,35 e 3,80. No estudo de Berryman et al (2006), 16% dos nutricionistas apresentaram uma atitude negativa forte (pontuação na EFG de pelo menos 4,4) e 13% atitude neutra (pontuação na EFG de pelo menos 2,5). No estudo de Swift et al (2013), 11% dos participantes apresentaram alta fobia de gordura, enquanto apenas 1% dos participantes apresentaram atitude neutra a levemente positiva. No estudo de Edelstein et al (2008), 76% dos nutricionistas avaliados tinham preferências fortes a moderadas por pessoas sem obesidade ou sobrepeso em comparação com pessoas com obesidade. Além disso, 85,2% dos nutricionistas com graduação e 75% dos nutricionistas com doutorado apresentaram preferência forte a moderada por indivíduos magros.

Além do estigma e das atitudes dos nutricionistas em relação ao peso e à obesidade, alguns estudos analisados nesta revisão avaliaram as causas presumidas da obesidade pelos nutricionistas. “Falta de atividade física”, “comer demais” e “falta de força de vontade” foram os principais fatores citados. Fatores genéticos ou relacionados a doenças foram vistos como menos relevantes, confirmando a opinião de que a obesidade é apenas uma questão de autocontrole. Swift et al (2013) aplicaram a escala de percepção sobre as pessoas com obesidade (Beliefs about Obese People Scale) e encontraram que os estudantes de Nutrição são mais propensos a acreditar que a obesidade pode ser controlada pela própria pessoa.

Embora seja um desafio mudar a maneira de pensar da sociedade sobre as pessoas com sobrepeso e obesidade, um primeiro passo fundamental seria começar com o grupo ocupacional cuja responsabilidade é tratá-los com compreensão e respeito. Uma forma sugerida pelos autores consiste em incluir a questão da estigmatização do peso (e suas consequências) como parte do programa acadêmico de alunos de nutrição, bem como para outras áreas relacionadas. Tanto os alunos quanto os profissionais devem estar cientes de que o estigma do peso e do indivíduo com obesidade, bem como a incompreensão quanto à sua etiologia podem ter efeitos negativos na saúde física e mental dos indivíduos, impedindo-os de procurar acompanhamento por um profissional da saúde.

Para ler o artigo na íntegra, clique aqui.

 

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