Em 2019, a comissão EAT-Lancet sobre “Dietas Saudáveis em Sistemas Alimentares Sustentáveis” em seu relatório propôs um modelo de referência de alimentação saudável para a saúde humana e do planeta, chamado “Dieta da Saúde Planetária”. Este foca no consumo predominante de hortaliças, frutas, grãos integrais, leguminosas, nozes, gorduras insaturadas, inclui um baixo a moderado consumo de frutos do mar e aves e um baixo ou nenhum consumo de carne vermelha, carne processada, açúcar de adição, grãos refinados e hortaliças ricas em amido.
O que é o índice da Dieta da Saúde Planetária?
Em 2021 foi proposto o “Índice da Dieta da Saúde Planetária” que consiste em 16 componentes que pontuam proporcionalmente e consideram todos os grupos de alimentos preconizados pelo EAT-Lancet. Os escores já foram associados a maior qualidade geral da alimentação e menor emissão de gases de efeito estufa. No entanto, este índice ainda não tinha sido testado quanto a associações com desfechos de saúde. Um estudo publicado em 2021 objetivou avaliar a relação entre a adesão às recomendações do EAT-Lancet, avaliadas de acordo com o “Índice da Dieta da Saúde Planetária”, e os desfechos de obesidade.
O estudo é uma análise transversal com dados de base do ELSA-Brasil, um estudo multicêntrico e de coorte em andamento, realizado em seis cidades brasileiras (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre, Belo Horizonte e Vitória). O consumo alimentar foi avaliado por um questionário de frequência alimentar semiquantitativo, previamente desenvolvido e validado, com 114 itens alimentares. O “Índice da Dieta da Saúde Planetária” é baseado nas recomendações proposta pela comissão EAT-Lancet, e possui 16 componentes, divididos em quatro categorias: (1) componentes de adequação – nozes e amendoins, leguminosas, frutas, hortaliças e cereais integrais; (2) componentes ótimos – ovos, laticínios, peixes e frutos do mar, tubérculos e batatas e óleos vegetais; (3) componentes de proporção – razão entre hortaliças verdes escuras e hortaliças totais e razão entre hortaliças vermelhas e laranja e hortaliças totais; e (4) componentes de moderação – carne vermelha, frango e substitutos, gorduras animais e açúcares de adição. Cada um dos 16 componentes pode pontuar proporcionalmente entre 0 e 5 ou 10 pontos. As medidas antropométricas de peso, altura e circunferência da cintura (CC) foram obtidas por meio de critérios e técnicas padronizadas internacionalmente. O Índice de Massa Corporal (IMC) e a CC foram tratados como variáveis contínuas e utilizados também para gerar medidas de obesidade e obesidade abdominal, respectivamente. Os participantes ainda realizaram exames clínicos e responderam questionário com foco nas suas características sociodemográficas.
Estudo investiga adesão à Dieta da Saúde Planetária e seu impacto no estado nutricional
Os participantes do estudo com “Índice da Dieta da Saúde Planetária” mais alto eram mais propensos a serem idosos, brancos ou de outra raça, não fumantes, terem maior renda per capita, não apresentarem consumo excessivo de álcool, terem maiores níveis de atividade física, terem diabetes ou hipertensão e apresentarem menor ingestão energética total. De acordo com análises ajustadas, os indivíduos com maiores escores do índice apresentarem valores de -0,50kg/m2 para o IMC e -1,70cm para CC, quando comparado com os indivíduos com menores pontuações no índice (aqueles do primeiro quinto). Além disso, houve uma diminuição de -0,15kg/m2 no IMC e -0,52cm na CC para cada aumento de 10 pontos na pontuação do índice. Os resultados de regressão multinomial sugeriram que pontuações mais altas no índice (aquelas dos indivíduos do quinto de pontuação) foram associadas a uma menor probabilidade de obesidade, quando comparadas com aqueles com menor pontuação.
Uma associação inversa foi encontrada entre a adesão às recomendações do EAT-Lancet (avaliadas pela pontuação no Índice da Dieta da Saúde Planetária) e indicadores de obesidade avaliados pelo IMC e CC, tanto de forma contínua como categorizada, ou seja, quanto maior a adesão ao modelo de alimentação proposto melhor o estado nutricional dos indivíduos. Apesar dos resultados promissores deste estudo, os autores ressaltam que grande parte da população avaliada atingiu apenas a metade dos pontos possíveis no índice, indicando que essa população teve baixa adesão às recomendações para uma alimentação saudável e sustentável, tendo como uma possível explicação o elevado consumo de carne vermelha pela população brasileira e o baixo consumo de oleaginosas.