Ganho de peso e mudança no índice de massa corporal de brasileiros depois dos 20 anos

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A obesidade é considerada um problema de saúde pública, visto sua alta prevalência e o impacto que ela produz tanto em nível individual quanto coletivo. A obesidade é uma doença multifatorial e sua prevalência mundial entre os anos de 1975-2016 quase triplicou, o que por sua vez, contribuiu para o aumento de doenças crônicas não transmissíveis. No Brasil, também é possível se observar tal panorama. Segundo dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico – Vigitel, em 2016 18,9% dos adultos brasileiros tinham obesidade, já em 2019 a medida observada foi ainda maior, chegando a 20,3%, com proporção similar para ambos os sexos.

Alguns fatores que podem contribuir para a ocorrência de obesidade na população incluem dietas pobres nutricionalmente, nas quais os alimentos ultraprocessados são preferidos em detrimentos dos alimentos in natura ou minimamente processados. Alimentos ultraprocessados são ricos em energia, açúcares livres, gorduras trans, sal e pobres em fibras e micronutrientes como potássio, por exemplo, e estão amplamente disponíveis nos ambientes alimentares. Tais características conferidas aos alimentos ultraprocessados promovem um desbalanço nutricional, levando ao aumento do risco de ganho de gordura corporal em excesso. Para além disso, outros fatores podem desempenhar um papel, em menor escala, no quadro da obesidade, como: fatores genéticos e sociodemograficos.

A trajetória brasileira em relação ao excesso de peso é bem documentada, porém há uma escassez de dados de estudos de base populacional avaliando ganho de peso e mudanças no estado nutricional ao longo da vida e diferenças entre homens e mulheres. Um estudo realizado com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do ano de 2013 teve como objetivo avaliar as mudanças de peso e estado nutricional na idade adulta e identificar os fatores sociodemográficos associados a esta mudança, examinando sua influência em homens e mulheres.

A PNS é uma pesquisa de âmbito nacional e base domiciliar, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e o Ministério da Saúde. A população pesquisada compreendeu moradores de domicílios particulares situados em todo o território nacional, considerando as cinco regiões, áreas urbanas e rurais e todas as faixas de renda. O presente estudo avaliou dados de 21.743 adultos de 30 anos a 59 anos.

Dentre as principais questões de interesse, estão os dados de peso aos 20 anos e no momento da pesquisa, assim como a altura, utilizados para o cálculo de variação de peso e de índice de massa corporal (IMC) dos indivíduos, bem como características sociodemográficas (sexo, raça, idade, escolaridade, área de residência). Os dados do peso aos 20 anos foram coletados com base nas perguntas: “Você se lembra qual era o seu peso aproximado com cerca de 20 anos de idade?”, “Se sim, qual?”.

O IMC foi calculado com base dos dados de peso e altura coletados, os indivíduos foram classificados de acordo com o critério da OMS: peso normal (IMC <25Kg/m2), sobrepeso (IMC 25 – 30 Kg/m2) e obesidade (IMC >30Kg/m2). Com isso, foi estimada a diferença do peso corporal e do IMC no momento da pesquisa e aos 20 anos.

A estimativa de mudança de peso e IMC foi calculada para a população brasileira e para cada variável estudada, estratificada por sexo.

Dentre os 21.743 adultos avaliados, 55,1% eram mulheres e 44,8% homens, a amostra foi predominantemente composta por indivíduos brancos, seguidos de pardos, a maioria tinha 12 ou mais anos de escolaridade, e foram observados mais moradores de área urbana. A média de peso e o IMC em homens com 20 anos foi de 66,1 Kg e 22,4Kg/m2, enquanto na idade atual em que foram avaliados 79,8 Kg e 27,0Kg/m2. A média de peso e o IMC em mulheres com 20 anos foi de 53,9 Kg  21,3Kg/m2, enquanto na idade atual em que foram avaliados 69,6 Kg e 27,5Kg/m2. Deste modo, houve um aumento de 20,7% e 29,1% no IMC de homens e mulheres avaliados, respectivamente.

Tratando-se da raça/cor, há diferenças para peso aos 20 anos e no momento da pesquisa entre indivíduos brancos e pretos, porém a diferença para o IMC só foi observada entre os homens, com maiores estimativas na população branca. As mulheres apresentaram ganho de peso superior aos homens (média de 0,8 kg/ano e 0,7 kg/ano respectivamente) e o período de maior ganho de massa corporal foi na primeira década da vida adulta (até os 35 anos).

Em análises ajustadas, a idade foi associada à mudança de peso e IMC de homens (cada ano adicional resultou em incremento de 0,10 kg e 0,04 kg/m2) e mulheres ((cada ano adicional resultou em incremento de 0,22 e 0,09 kg/m2). Já o nível educacional foi relacionado ao aumento de peso: homens com escolaridade igual ou superior a 12 anos tiveram maior ganho de peso, se comparados ao grupo de 0-8 anos de estudo; e em mulheres foi observado um menor IMC entre aquelas com escolaridade igual ou superior a 12 anos, se comparadas ao grupo de 0-8 anos de estudo. Quanto a área de residência, houve associação significativa em relação a mudança de peso e IMC em homens. Aqueles residentes em área rural tenderam a ganhar menos peso e IMC em comparação ao grupo que residiam em território urbano.

Não foi encontrada associação entre raça/cor da pele e ganho de peso. No entanto, no Brasil, a literatura aponta que a prevalência de obesidade é maior entre as mulheres negras do que as brancas. O nível educacional foi considerado um proxy de renda, mulheres que estudaram por 12 anos ou mais mostraram associação negativa com a mudança de peso e IMC. Considerando raça/cor como uma variável social e não biológica, a escolaridade parece ter sido melhor para explicar a relação entre vulnerabilidade e estado nutricional no presente estudo.

Os resultados da pesquisa mostram que, em geral, menos de 40% dos indivíduos que tinham peso adequado (eutróficos) aos 20 anos mantiveram-se assim a partir dos 30 anos, e mais de 60% dos adultos com obesidade aos 20 anos continuaram com obesidade ao longo dos anos.

O estudo tem algumas limitações, dentre elas, ser suscetível ao viés de recordação de memória, devido ao relato retrospectivo de peso; por se tratar de um estudo transversal, os entrevistados avaliados para eventos tinham idades diferentes no momento da entrevista; e as faixas etárias mais velhas podem apresentar efeito cumulativo para este erro sistemático, levando a subestimar ou superestimar o peso relatado. O estudo aponta para a necessidade de fortalecimento de políticas públicas que reconheçam os determinantes sociais da saúde e que promovam a adoção de modos de vida saudáveis e ressalta a importância do cuidado de pessoas com sobrepeso e obesidade, uma vez que excesso o peso corporal pode levar ao desenvolvimento de outras doenças crônicas não transmissíveis.

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