A má qualidade da alimentação é um dos principais fatores associados ao aumento da prevalência de sobrepeso e obesidade. Fatores econômicos, como preço dos alimentos e a renda dos indivíduos, são exemplos de determinantes do consumo alimentar. Análises históricas de tendências dos preços dos alimentos indicam um aumento constante dos preços dos alimentos in natura ou minimamente processados e dos ingredientes culinários em comparação aos alimentos ultraprocessados. Essa tendência é observada desde a década de 1970 e coincide com o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados e da obesidade no Brasil.
Um estudo sobre a tendência de preços dos alimentos apontou que em 2026 a alimentação a base de ultraprocessados seria mais barata do que aquela baseada em alimentos in natura ou minimamente processados. Contudo, a pandemia de COVID-19 impactou a economia global, incluindo o preço dos alimentos. Devido a isto, o estudo em questão teve como objetivo analisar a evolução dos preços dos alimentos no Brasil no período de janeiro de 2018 a março de 2022, avaliando o período da pandemia de Covid-19 (de março de 2020 a março de 2022) e com projeções de preços até 2025.
Foram utilizados dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2017/2018) e do Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor (SNIPC) para criar um conjunto de dados, referentes ao período de janeiro de 2018 e março de 2022, contendo os preços mensais (R$/kg) dos alimentos e bebidas mais consumidos no país (n=95). Os itens alimentares foram divididos de acordo com classificação NOVA. Os preços dos alimentos in natura ou minimamente processados e ingredientes culinários foram calculados em conjunto, devido a utilização em conjunto destes subgrupos de alimentos em preparações.
O preço médio de cada grupo e subgrupo foi estimado por ano de estudo e por todo o período, com base na média ponderada do preço de seus constituintes – quantidade adquirida em quilogramas. O preço mensal de cada grupo e seus principais subgrupos foram plotados para analisar as variações de janeiro de 2018 a março de 2022 e foi feita a projeção de variações de preços até 2025. Os preços relativos entre alimentos classificados como saudáveis (alimentos in natura ou minimamente processados e ingredientes culinários processados) e alimentos não saudáveis (alimentos processados e ultraprocessados) foram calculados com base nas séries de preços reais e estimados.
Os resultados apontaram que o grupo dos alimentos ultraprocessados foi o de maior valor no período estudado, seguidos pelos alimentos in natura ou minimamente processados e ingredientes culinários e pelos alimentos processados. Os subgrupos de alimentos com preços mais elevados foram os de carnes processadas, produtos de confeitaria e carnes minimamente processadas, e os preços mais baixos foram os de sal, açúcar e refrigerantes.
Em relação as tendências de preços, foi observado um aumento de preços de alimentos in natura ou minimamente processados e de ingredientes culinários processados (R$ 15,3/kg para R$ 18,1/kg), no período de 2018 a 2022. Enquanto, os alimentos processados (R$ 16,6/kg para R$ 15,5/kg) e ultraprocessados (R$ 22,1/kg para R$ 19,4/kg) diminuíram no mesmo período. Ao considerar o período de 2018 a 2025, o estudo indica uma perspectiva de acréscimo nos preços dos alimentos in natura ou minimamente processados e dos ingredientes culinários processados (R$ 15,3/ kg para R$ 22,5/kg), decréscimo dos preços dos alimentos processados (R$ 16,6/kg para R$ 11,33/kg) e nos preços dos ultraprocessados (R$ 22,1/kg para R$ 20,2/kg), com destaque ao aumento no preço dos alimentos in natura ou minimamente processados a partir de 2020, que a partir destas estimativas ficariam mais caros que os ultraprocessados e os alimentos processados no Brasil a partir de 2022.
Ao final de 2019, a inflação dos alimentos saudáveis, medida pelo IPC (índice de preços ao consumidor), superou a dos alimentos não saudáveis, atingindo uma diferença de 40 pontos percentuais ao final do período estudado. Entre janeiro de 2018 e março de 2022, o preço relativo dos alimentos saudáveis e não saudáveis aumentou de 69,3% para 94,6%. Em maio de 2022, essa relação ultrapassou 100,00%, e chegará a 130,8% em 2025. Todos os grupos de alimentos apresentaram aumento da inflação no período de janeiro de 2018 a março de 2022, embora este crescimento tenha sido menos acentuado entre alimentos processados e ultraprocessados. O índice para alimentos in natura ou minimamente processados e de ingredientes culinários processados apresentou maiores variações no período, com pico em 2018, seguido de período de estabilidade até 2019.
Dentre as hipóteses para os achados, se destaca o impacto da pandemia da Covid-19 na economia global, devido às restrições à exportação/importação e impacto das medidas restritivas. As restrições e medidas restritivas interferiram no abastecimento de alimentos, ao afetar tanto produtores como consumidores, e impactar a produção e escoamento, que se tornaram insuficientes. Como possível consequência deste aumento nos preços dos alimentos saudáveis, se destaca o agravamento da insegurança alimentar no Brasil.
Conclui-se que incentivos à cadeia de produção e comercialização de alimentos saudáveis, como isenções fiscais e financiamento com taxas abaixo dos valores de mercado, e a tributação de alimentos não saudáveis são possibilidades importantes para reverter o cenário descrito.