O excesso de peso corporal pode ser avaliado usando índices de peso por altura, como o Índice de Massa Corporal (IMC) ou índices/medidas de obesidade abdominal, como circunferência da cintura, relação cintura/quadril (RCQ) e relação cintura/estatura (RCE). Estudos prévios indicam que a adiposidade abdominal é um melhor preditor de resultados cardiometabólicos do que o IMC. Contudo, dados atuais sobre a relação entre IMC e obesidade abdominal, e sua associação com desfechos de saúde, geralmente referem-se a um ou um pequeno número de países ou regiões.
Nesse sentido, foram realizadas análises em um banco de dados global obtido por meio de estudos de base populacional para avaliar a relação entre o IMC e a RCE em diferentes regiões do mundo. Além disso, foi avaliada a relação do IMC e da RCE com a hipertensão, bem como a capacidade dos referidos índices de adiposidade em predizer a prevalência de hipertensão. Para tal, foram utilizados dados de 837 estudos realizados entre 1990 e 2023, incluindo 7,5 milhões de pessoas de ambos os sexos na faixa etária de 20 a 64 anos, provenientes de 181 países e agrupadas em oito regiões do mundo.
Após o ajuste para idade e IMC, a média da RCE foi maior no sul da Ásia para ambos os sexos, seguida pela América Latina e Caribe e pela região da Ásia Central, Oriente Médio e norte da África. Em contrapartida, a RCE foi menor na Europa Central e Oriental para ambos os sexos, na região oeste de alta renda para as mulheres e na Oceania para os homens. A Oceania exibiu distribuições de IMC mais altas em comparação com as demais regiões, seguida pela Ásia Central, Oriente Médio e Norte da África e América Latina e Caribe para as mulheres, e pela região ocidental de alta renda e Europa Central e Oriental para os homens. Em todas as regiões, as distribuições do IMC e da RCE das mulheres foram amplas do que as dos homens. Ademais, dentro de cada região, o IMC e a RCE foram fortemente, mas não perfeitamente, correlacionados.
Embora a prevalência total de hipertensão tenha variado entre as regiões, em todas as regiões a prevalência aumentou tanto com o IMC quanto com o RCQ. Para IMC baixo (≤22,5 kg/m²) e RCQ baixo (≤0,40), a prevalência de hipertensão foi de 25% ou menos em todas as regiões. Para IMC elevado (≥37,5 kg/m²) e RCQ elevado (≥0,75), a prevalência de hipertensão foi de 39% ou mais para mulheres e 49% ou mais para homens em todas as regiões; na Europa Central e Oriental, foi de 80% ou mais para ambos os sexos..
Em todas as regiões, a capacidade de prever hipertensão foi praticamente idêntica entre os modelos que incluíam apenas o IMC ou apenas a RCE como medida de adiposidade. Incluir tanto o IMC quanto o RCE levou a uma melhoria mínima no desempenho preditivo dos modelos em comparação com o uso de apenas uma medida. Em nível global e regional, as estatísticas dos modelos foram consistentemente maiores para mulheres do que para homens.
O fato de algumas regiões apresentarem maior RCE em faixas semelhantes de IMC pode ser atribuído a diferenças genéticas e de estilo de vida, que podem afetar distribuições composição corporal das populações. As diferenças observadas em relação à média da RCE também podem ser explicadas por diferenças fenotípicas relacionadas à nutrição no início da vida, especialmente a altura e a altura do tronco em relação à altura da perna, o que, por sua vez, influencia a distribuição da gordura corporal e massa magra.
A maior média da RCE em qualquer faixa de IMC observada entre mulheres em comparação aos homens, e as variações entre as regiões, podem ser decorrentes de três fatores: a distribuição da gordura corporal é afetada pelos hormônios sexuais, que variam devido à genética, nutrição, meio ambiente e papéis sociais; diferenças nos comportamentos reprodutivos, incluindo a idade do primeiro filho e a taxa de fertilidade total, que podem afetar diferencialmente a circunferência da cintura e o peso; e devido ao gradiente social e a variação geográfica da obesidade que são maiores nas mulheres do que nos homens.
A semelhança do IMC e da RCE na predição da prevalência de hipertensão é convergente com ou outros estudos e pode ser explicada pelo fato de tanto a adiposidade total quanto a adiposidade abdominal atuam por mecanismos semelhantes no aumento da pressão arterial, incluindo a resistência à insulina, a inflamação e o aumento da leptina, a maior atividade do sistema nervoso central, dentre outros fatores.
Em conclusão, neste estudo global, com dados representativos das populações de todas as regiões do mundo, observou-se que o IMC e a RCE estavam correlacionados no nível individual. Em cada região, o IMC e a RCE previram a prevalência de hipertensão com a mesma eficácia. No entanto, para qualquer faixa de IMC, a RCE foi mais alta no sul da Ásia, América Latina e Caribe, e na região da Ásia Central, Oriente Médio e Norte da África (especialmente para mulheres), e mais baixo na Europa Central e Oriental e, para homens, na Oceania.