Estigma relacionado ao peso corporal no cuidado em saúde

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O estigma relacionado ao peso corporal pode ser definido como a desvalorização social de pessoas em decorrência de seu peso corporal elevado, que leva à produção de atitudes discriminatórias e preconceituosas direcionadas a esses indivíduos. A literatura tem evidenciado diversos impactos negativos do estigma relacionado ao peso corporal sobre a saúde de pessoas com sobrepeso e obesidade, entre eles: a piora de parâmetros bioquímicos e metabólicos; produção de sofrimento mental associado a depressão e ansiedade, piora da percepção corporal, transtornos alimentares e comer transtornado; e prejuízos à vida social. Além disso, presença de estigma relacionado ao peso corporal entre estudantes e profissionais de saúde, por meio de tratamentos discriminatórios, foco exacerbado no peso corporal, crenças e atitudes estigmatizantes e nos serviços de saúde, de forma estrutural, prejudica o cuidado e afasta pessoas com sobrepeso e obesidade desses espaços.

No Brasil, a educação permanente é preconizada como estratégia prioritária de formação de trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Política Nacional de Formação Permanente em Saúde (PNFPS) e atualmente não há nenhuma iniciativa pública que vise a formação de estudantes e profissionais de saúde no tema “estigma relacionado ao peso corporal”. Dado este cenário, um artigo publicado em 2024 teve como objetivo relatar os resultados da aplicação de um curso educativo sobre o estigma relacionado ao peso corporal e o cuidado em saúde com profissionais de saúde inseridos na Atenção Primária à Saúde (APS) de municípios do Grande ABC Paulista (São Paulo).

Inicialmente foi elaborado um curso educativo de 30 horas intitulado “Narrativas do peso: o estigma relacionado ao peso corporal e o cuidado em saúde” (disponível no link: https://cursosextensao.usp.br/course/view.php?id=2761). O curso apresenta conteúdo distribuído nos em seis seguintes eixos: 1) etiologia da obesidade; 2) implicações sociais da obesidade e interseccionalidade; 3) estigma relacionado ao peso corporal; 4) consequências do estigma para o cuidado em saúde; 5) formas de combater e se portar frente ao estigma; e 6) ativismo gordo: aceitação e empoderamento. Posteriormente o curso foi disponibilizado para um grupo de 15 profissionais de saúde que atuavam na rede de APS do SUS nos municípios do Grande ABC Paulista (SP), dos quais 11 concluíram o curso.

O processo de análise dos resultados teve desenho misto. No componente quantitativo, foi realizada análise estatística dos resultados obtidos por meio da Antifat Attitudes Test (AFAT) traduzida e adaptada, aplicada ao início e ao término do curso. Para o componente qualitativo foi solicitado aos participantes que escrevessem cinco ideias, desenvolvidas em um parágrafo cada, sobre o que ficou marcado para eles a partir do curso.

A idade média da amostra de profissionais foi de 46,2 anos, e 90% eram mulheres. Dentre as profissões participantes destacou-se a de nutricionista, representando 45% da amostra, sendo o restante composto por: médico, dentista, fonoaudióloga, profissional de educação física e dois administradores/gestores de serviços. Não houve diferença significativa relacionadas às atitudes antiobesidade (medida pelo AFAT) dos participantes antes e após o curso (componente quantitativo). Cinco temas emergiram a partir da análise qualitativa, sendo eles: “obesidade: multifatorial e complexa”, “sociedade e interseccionalidade”, “barreiras para oferecer um cuidado inclusivo”, “reflexão e necessidade de mudança”, “considerações sobre o curso”. A análise qualitativa realizada ao final do curso e os feedbacks dos participantes demostraram que o curso promoveu uma compreensão ampliada dos conteúdos bem como a reflexão e a autocrítica dos profissionais de saúde.

Apesar da ausência de resultados significativos na análise quantitativa, provavelmente relacionada ao tamanho reduzido da amostra e sua provável sensibilização prévia para o tema, as análises qualitativas apontaram para uma compreensão ampliada a respeito dos temas discutidos, reflexão e autocrítica dos profissionais. Por fim, são necessários mais estudos que verifiquem impacto do curso educativo em amostragens maiores e mais diversas, além de instrumentos quantitativos capazes de avaliar a presença de estigma relacionado ao peso corporal em estudantes e profissionais de saúde.

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